Espírito da Verdade Aspectos da pneumatologia joanina
Introdução
Um dos mais importantes temas do evangelho de João é a pneumatologia – a sua apresentação da pessoa e atividade do Espírito de Deus. Juntamente com o evangelho de Lucas, o de João é o que mais acentua a ação do Espírito na vida de Jesus e, consequentemente, na de seus discípulos – do passado e em todos os tempos. Diferentemente do evangelho de Lucas, porém, o de João também se ocupa da atividade do Espírito em relação às pessoas que estão fora da comunidade cristã, além de se ocupar também da ação do Espírito na vida dos cristãos após a morte e ressurreição de Cristo (este último tema é tratado, nos escritos lucanos, no livro de Atos). Refletiremos sobre três dos aspectos da penumatologia joanina, baseando-nos, mais uma vez, na teologia de Leon Morris.
O Espírito da verdade
Durante a última ceia, na noite antes da crucificação, Jesus transmitiu um ensinamento importante sobre o Espírito Santo. Há cinco passagens principais: 14,16-17; 14,26; 15,26; 16,7-11; 16,12-15. Jesus o chama de “Espírito da verdade” (14,17; 15,26; 16,13), expressão que aponta para um dos grandes conceitos deste evangelho. João fala muito da verdade e deixa claro que, em seu sentido mais profundo, a verdade tem uma ligação estreita com Jesus e com o que ele está fazendo (14,6). O Espírito, portanto, está ligado à verdade de Deus que vemos na obra de Jesus. Ele é “o Espírito que transmite a verdade”, o Espírito que ensina às pessoas a verdade do evangelho, a verdade que está em Jesus. Os manuscritos de Qumran também usam essa terminologia ao se referir aos “espíritos da verdade e do erro” (1QS iii 18-19). Esse, porém, é um exemplo impressionante de como os mesmos termos contêm uma grande diferença no ensino.
Os homens de Qumran consideravam o “espírito da verdade” um dos espíritos que lutavam pelo domínio dentro do ser humano. Parece que o “espírito do erro” está no mesmo nível do “espírito da verdade”; não existe a grandiosidade que João vincula ao Espírito Santo. Aqueles que adoram o Pai devem fazê-lo “em verdade” (4,23-24), e Jesus é a “verdade” (14,6); “o Espírito da verdade”, portanto, liga o Espírito ao Pai e ao Filho. Como Espírito da verdade, o Espírito conduzirá os discípulos em (ou a) toda a verdade (16,13). Isso não é uma verdade como conceito filosófico, mas a verdade revelada em Jesus; o Espírito os levará a uma compreensão ainda mais plena do que essa verdade significa. É à medida que o Espírito nos conduz e não por meio da sabedoria deste mundo que veremos o que vem a ser a verdade de Deus.
Mas o Espírito não está fazendo alguma revelação própria que substitua aquilo que Jesus disse. Jesus diz expressamente: “[Ele] não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido”; não haverá uma revelação nova, dada pelo Espírito. O Espírito continuará o ensino que Jesus deu. Provavelmente devemos entender as palavras que seguem da mesma maneira: “[Ele] vos anunciará as coisas que hão de vir”. Dificilmente podemos entender isso com o sentido de que o futuro será esclarecido aos cristãos, porque:
1) as palavras não dizem necessariamente isso, e 2) em todos esses séculos os cristãos têm estado tão perplexos como todos os outros quanto ao que está por vir. Antes, as palavras significam que o Espírito levará os crentes a entender o que o caminho cristão significa. Na época em que Jesus falou não havia teólogos cristãos que tivessem desenvolvido uma compreensão do que é o cristianismo. No transcurso dos séculos seguintes, porém, o Espírito esteve agindo na igreja e levou o povo de Deus a uma maior compreensão do que a sua fé significa.
O mestre da igreja
Há bastante ênfase na função de ensino do Espírito Santo nesses discursos. Jesus disse que ele ensinaria aos discípulos “todas as coisas” (panta 14,26). Isso é ampliado com o acréscimo destas palavras: “E vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito‟. Portanto, o que o Espírito ensina é o que foi revelado em Cristo. O que Jesus ensinou não será substituído mais tarde por alguma nova “dispensação do Espírito”. O Espírito ensina o que Jesus ensinou. A revelação cristã definitiva foi feita em Cristo, e mesmo que algumas implicações dessa revelação ainda estejam por se desvendar, é essa revelação e não alguma outra que é o objeto correto do ensino cristão. O Espírito “dará testemunho” de Cristo (15,26). A ideia de dar testemunho é importante neste evangelho e aponta para algo que é certo, não uma possibilidade que possa ser substituída por algo melhor.
Quando, portanto, o Espírito “dá testemunho”, ele está mostrando quem Jesus era e o que ele fez. É significativo que logo em seguida Jesus diz: “Vós também testemunhareis”. Não se pede que os apóstolos melhorem o que seu mestre lhes ensinou e fez por eles; eles simplesmente contarão tudo isso a outros. Mas só o farão à medida que o Espírito os guiar. Jesus diz: “[O Espírito] me glorificará, porque há de receber o que é meu e vo-lo há de anunciar” (16,14). O Espírito não veio para desviar a atenção de Jesus, assim como não veio para modificar o seu ensino. Por isso, tudo o que ele fizer glorificará a Cristo, e novamente temos a ideia de que é o ensino de Jesus e não alguma novidade que o Espírito transmitirá aos apóstolos. Desta vez temos um adendo: “Tudo quanto o Pai tem é meu; por isso é que vos disse que há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar” (16,15). Jesus está falando das coisas que pertencem a ninguém menos que Deus, e essas coisas não podem ser tratadas com leviandade.
A presença divina
O Espírito estaria com os apóstolos para sempre (14,16). Jesus explica que, longe de ter o Espírito para sempre, o mundo nem sequer pode receber o Espírito da verdade (14,17): ele não o vê, não conhece. Por toda a história da Igreja, quem estava fora da igreja considerou o cristianismo tolice. Ele não faz sentido para aqueles que são insensíveis aos estímulos do Espírito da verdade. Para aqueles que o recebem, a história é outra. Nada em todo esse mundo pode se comparar ao conhecimento que podemos ter de Deus e à habitação do seu Espírito em nós, com a paz, o poder e o dinamismo que essas realidades proporcionam. “Convém-vos que eu vá”, disse o mestre, “porque se eu não for, o Consolador não virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei” (16,7). Para os que estavam com ele na última ceia, essa afirmação deve ter sido angustiante. Eles tinham deixado tudo – casa, família, amigos e trabalho – para estar com ele.
Agora ele diz que é melhor para eles que ele os deixe. Ele lhes está dizendo que sua presença física, que foi útil durante o seu ministério, não era a melhor coisa para eles. Obviamente ela estava sujeita às limitações de tempo e espaço, e as necessidades dos discípulos nem sempre surgiam quando eles estavam fisicamente junto dele. A vinda do Espírito, no entanto, era diferente. Seria uma presença que jamais seria tirada. Era melhor para eles, como também é para nós, que o Espírito divino esteja permanentemente presente. Essa presença é algo que pertence aos que são de Deus e somente a eles. Jesus disse claramente sobre o Espírito que o mundo não o recebe “nem pode”; ele não o vê nem o conhece (14,17).
Há pessoas espiritualmente cegas e ignorantes. Sem visão nem conhecimento, é claro que elas não podem se pronunciar sobre as atividades do Espírito. Para elas, esse território é completamente desconhecido. Todavia, Jesus disse aos discípulos que o Espírito ficaria com eles e estaria neles (14,17). Aquilo que o mundo é incapaz até de perceber é uma das boas dádivas de Deus para os discípulos. O triunfo sobre o mal não é uma conquista humana; é resultado da obra do Espírito Santo em seu povo e em favor dele.”
Fonte consultada:
MORRIS, Leon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2004, p. 312-314.)
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